ARTIGO – ENTRE LIBERDADE E SEGURANÇA
No início todos são inocentes. Nascemos inocentes, puros, livres. Depois perdemos a inocência, a pureza, a liberdade. Aí recuperar e conservar a liberdade será uma luta. Ao contrário da escravidão, a liberdade necessita de segurança. Os laços relacionais adquiridos numa comunidade oferecem esta segurança. Bauman mostra isto narrando as histórias de Dântalo e Adão e Eva. Tudo vai bem até eles tomarem decisões. O desejo do poder contaminou e destruiu a inocência original. Buda já alertava que o desejo é um perigo. Devemos ser o que somos. O desejo nos leva para o que sonhamos. Viviam numa comunidade (paraíso), convívio (festa). Tinham recebido tudo, mas queriam mais. A punição veio em seguida. Viver do próprio trabalho e nunca saciar a fome e a sede. A transgressão afastou do aconchego comunitário, do círculo amoroso, da segurança. Isto custou caro e nunca mais foi recuperada a inocência original. O referencial para viver a liberdade e a segurança é a comunidade, o círculo aconchegante (Rosemberg,B.24), mas nela deve existir “um entendimento compartilhado por todos os seus membros” (Tonnies,B.15). Tudo indica que a ruptura do círculo amoroso humano do círculo amoroso divino (paraíso bíblico e deuses gregos) se deu no uso da liberdade como busca do desejo do poder. As consequências foram desastrosas. A sociedade vive no conflito entre liberdade e escravidão, segurança e violência. Como liberdade e segurança são características fundamentais da vida, há uma necessidade urgente da busca do entendimento compartilhado. Isto é possível com a recriação do espírito comunitário, da liberdade solidária, da volta ao círculo amoroso divino. Fortaleza, 11.02.2025 Ozanir Martins Silva (Nossa Senhora de Lourdes).
MUNDO – Política global de drogas: saúde, não guerra

Na 68ª sessão da Comissão de Narcóticos da ONU, a América Latina brilhou: com suas propostas e exemplos, Colômbia, Brasil e Uruguai mostraram que só uma abordagem baseada na saúde pública, e não na violência, faz uma boa política de drogas Por Cláudia Braga, para a coluna Cuidar das pessoas, cuidar das cidades Aconteceu em Viena, entre os dias 10 e 14 de março de 2025, a 68ª sessão da Comissão de Narcóticos (Commission on Narcotic Drugs – CND), órgão da ONU responsável pela formulação de políticas relacionadas às drogas. A CND serve como fórum global para discussões e formulações de respostas aos desafios relacionados às drogas, abrangendo desde organizações e economias ilícitas até os impactos na vida das pessoas afetadas pelo tráfico e pelo uso de substâncias. Nas sessões anuais, os Estados-membros da ONU, incluindo o Brasil, estabelecem compromissos internacionais que influenciam mudanças nas legislações e políticas públicas nacionais — daí a importância de acompanhar as decisões tomadas nesse espaço. A 68ª CND foi histórica devido ao ineditismo de algumas resoluções adotadas e ao próprio processo de aprovação, com todas sendo submetidas à votação em um ambiente onde a norma é buscar o consenso — prática conhecida como “espírito de Viena”. Mais uma vez, os EUA desafiaram o multilateralismo, levando blocos de países que historicamente se opõem devido a divergências em políticas de drogas a votarem juntos. Entretanto, não foi apenas por isso que essa CND foi histórica. As intensas trocas entre países e sociedade civil nos eventos paralelos à plenária, compartilhando inovações e discussões locais e demandando transformações, direcionaram novos rumos para refletir sobre políticas de drogas e redução de danos, a partir de uma perspectiva do Sul Global. A guerra às drogas afeta desproporcionalmente pessoas e países. Se é verdade que boas e efetivas respostas para políticas públicas são aquelas que dialogam com os problemas e necessidades reais das pessoas, a formulação de novos entendimentos e respostas para políticas de drogas só pode vir dos países do Sul mais afetados pela política de guerra às drogas. E é o que parece estar acontecendo, como mostrou a atuação das delegações do Brasil, da Colômbia e do Uruguai. Fonte: Site OUTRAS PALAVRAS Matéria Completa: Acesse Aqui
MUNDO – Uma Igreja a ser “desmasculinizada”

Com estas palavras de desaprovação, o Pontífice sublinhou, naquele contexto, a embaraçosa escassez da presença feminina. Na Aula Magna do Seminário de Mântua, no dia 28 de fevereiro, dia da Páscoa de Ivana Ceresa, primeira aluna da ISSR, Lucia Vantini, presidente da Coordenação das Teólogas Italianas, e Donata Horak, professora de Direito Canônico e membro do conselho da CTI, fizeram um relato do que está se movendo na Igreja a partir do neologismo extemporâneo, mas significativo – smaschilizzare – cunhado pelo Papa Francisco e usado por ele, em 2023, diante de um público exclusivamente masculino durante a Comissão Teológica Internacional. “Desculpem-me a franqueza… Uma, duas, três, quatro mulheres: coitadas! Eles estão sozinhos! Ah, desculpe: cinco! Precisamos avançar nisso.” Com estas palavras de desaprovação, o Pontífice sublinhou, naquele contexto, a embaraçosa escassez da presença feminina. A reportagem é de Laura Destro, publicado por Settimana News, 19-03-2025. “Desmascaramento” é, portanto, o convite do Papa e, para isso, ele confia ao Conselho de Cardeais a tarefa de um debate aberto com as mulheres. O fruto dos quatro encontros, realizados entre o final de 2023 e o início de 2024, está contido em uma quadrilogia, da qual os palestrantes presentes também são autores. Na esteira da sensibilidade profética de Ivana Ceresa que, já em 1994, em seu livro Minhas Queridas Irmãs, expressava o forte desejo de leitoras das Escrituras, capazes de falar de Deus, Lucia Vantini aprofunda o tema da desmasculinização da Igreja, tema do primeiro livro. Os tópicos abordados nas reuniões subsequentes estão definidos em Mulheres e Ministérios na Igreja Sinodal, Mulheres e Homens: uma Questão de Cultura, Poder e Vida. A pedido do Papa, o primeiro encontro explora o princípio petrino e mariano enunciado pelo teólogo suíço von Balthasar, que Lucia Vantini define como inquietante, assim como o verbo “desmascarar” o é, pela ideia subjacente de diferença de gênero e pelas reações que ela produz nas almas mais conservadoras do mundo católico, incluindo homens e mulheres. Por petrino entendemos aquilo que diz respeito à objetividade (o público, a autoridade, o ministério), dimensão própria dos homens; por mariano, a subjetividade (privada, emocional, de gestão da dor), uma esfera de relevância feminina. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui
ARTIGO – Profecia de uma comunidade intercongregacional na Amazônia

Eis o artigo. Uma comunidade intercongregacional de religiosas na Amazônia peruana, situada na Tríplice Fronteira entre Colômbia, Peru e Brasil. Três freiras que administram a paróquia do Senhor dos Milagres na Islândia (Peru), às margens do Rio Yavarí. Este texto é uma provocação para que diferentes comunidades religiosas se unam a esta comunidade intercongregacional ou para que outras comunidades religiosas formem outra comunidade intercongregacional na Tríplice Fronteira Amazônica da Colômbia, Peru e Brasil. Diferentes carismas na mesma comunidade As freiras que compõem esta fraternidade intercongregacional são duas freiras brasileiras e uma freira equatoriana, cada uma pertencente a uma congregação religiosa com diferentes identidades carismáticas dentro da Igreja Católica. Na Tríplice Fronteira Amazônica, existem diversas comunidades religiosas, masculinas e femininas, que atuam no Vicariato de San José del Amazonas (Peru), no Vicariato de Letícia (Colômbia) ou na Diocese de Alto Solimões (Brasil). Várias dessas comunidades religiosas são fraternidades internacionais, ou seja, são formadas por religiosos e religiosas, e alguns por leigos, do mesmo carisma, mas de países diferentes. Existe apenas uma comunidade religiosa que é intercongregacional, com irmãs de diferentes carismas dentro da Igreja Católica vivendo e servindo juntas. Está localizada na Islândia (Peru), no vicariato apostólico de San José del Amazonas. Esta comunidade intercongregacional se torna uma voz profética de fraternidade, missão compartilhada, sinodalidade, humildade e serviço carismático para o bem do povo de Deus da Amazônia. Superando as diferenças em prol da unidade Algo que chama a atenção nessa comunidade intercongregacional é que, apesar de as religiosas terem carismas diferentes, elas conseguem, por assim dizer, superar essas identidades carismáticas, concentrando-se em ter o mesmo Deus, a mesma Igreja, a mesma fé, o mesmo batismo e o chamado a viver em fraternidade, compartilhando a vida, a oração e a missão. Outra característica única desta comunidade intercongregacional é que são mulheres que lideram e acompanham uma paróquia na Amazônia peruana. Uma paróquia que, em seu centro urbano, tem uma minoria de católicos, pois a grande maioria de seus habitantes pertence a uma seita chamada Israelitas. A freguesia é muito grande, com muitas comunidades ribeirinhas e indígenas que fazem fronteira com o Brasil e a Colômbia. Essas freiras, em suas viagens missionárias para visitar as diferentes comunidades da Amazônia peruana dentro da jurisdição da paróquia que acompanham, encontram realidades complexas decorrentes da negligência do Estado, como falta de emprego, pobreza e cobertura limitada de saúde, entre outras realidades. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui
ARTIGO – O ‘Caim’ de Saramago. Artigo de Eduardo Hoornaert

“O romance de Saramago pode criar desconforto em leitores(as) acostumados(as) à apresentação de um Deus Senhor Todo-poderoso. Pois a apresentação da história bíblica feita pelo autor é de caráter militante. Por trás do tom de leveza e humor, que perpassa o texto, existe a ânsia de alguém que percebe que a humanidade se deixa enganar”, escreve Eduardo Hoornaert, historiador, ex-professor e membro fundador da Comissão de Estudos da História da Igreja na América Latina (CEHILA), em artigo publicado em seu blog, 15-03-2025. Eis o artigo. Esplendidamente escrito e demonstrando um domínio insuperável da língua portuguesa, o romance de José Saramago, Prêmio Nobel de literatura, intitulado Caim e editado pela Companhia das Letras (São Paulo, 2009), vem nos surpreender. Caim, irmão de Abel, é inimigo jurado de Senhor Deus. Condenado a viajar do futuro ao passado, das terras do amanhã às terras de ontem, sem nunca encontrar repouso, Caim vê por todo lado maus feitos desse Senhor Deus: por que rejeitar as ofertas de Caim e aceitar as de Abel, se ambos agem de boa vontade? Por que condenar com penas tão cruéis duas mulheres, Eva e a mulher de Lot, que agem por curiosidade, ou seja, por inteligência? Por que ordenar a Abraão matar seu próprio filho? Haverá ordem mais cruel e mais sem sentido? Por que lançar fogo e enxofre do céu sobre as crianças inocentes de Sodoma e Gomorra? Não são elas em maior número que as dez almas sem culpa que o Senhor Deus exigiu para não exterminar as cidades e toda a planície? O que as crianças têm a ver com a perversidade de seus pais? Por que contemplar com benevolência, do alto do Sinai, a matança de três mil pessoas, só porque alguns dançaram em torno de uma imagem, no acampamento do povo no deserto, já que toda criação é feita à imagem e semelhança de deus? Por que vingar de forma tão cruel a matança de 17 soldados israelitas pelas forças de Madiã, a ponto de ordenar o extermínio da cidade? E o que dizer das crueldades cometidas por Josué e seu exército na destruição total de Jericó, por ordem do Senhor? A lista é interminável. Caim conclui: as ordens do Senhor, além de incompreensíveis, são maldosas. O Senhor Deus só quer a derrota dos homens e Caim resolve combatê-lo de todas as forças. O romance termina dizendo que o Senhor Deus e sua criatura inconformada continuam discutindo pelos séculos afora. A única coisa que se sabe de ciência certa é que continuaram a discutir e que a discutir estão ainda (p. 172). Que discussão é essa? Eis o que constitui o segredo do romance. O que se pode dizer que Saramago não tem a intenção de escandalizar seus (suas) leitores(as) com disparates levianos e incongruentes contra os textos bíblicos, mas pretende lutar contra uma apresentação banalizada da Bíblia, que tira o sentido do texto, mas que infelizmente constitui a leitura comum nos dias em que vivemos. A estranheza que esse romance provoca em nós mostra que não conhecemos a Bíblia, mas estamos presos(as) a uma apresentação da literatura bíblica feita durante séculos pelas igrejas, por meio de sermões e do catecismo. O(a) leitor(a) atento(a) descobrirá logo que Saramago não comenta textos bíblicos. O romance todo só tem uma citação (da Carta aos Hebreus, 11, 4) no pórtico de entrada. Pelo resto, Saramago não comenta a Bíblia, ele se refere o tempo todo ao que se pode chamar de apresentação catequética da Bíblia, ou seja, à ‘História Sagrada’. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui