ARTIGO – BREVES TESES FILOSÓFICAS SOBRE CRENÇA E CIÊNCIA
Segundo Roger Bacon, teólogo e filósofo franciscano do Medievo, a ignorância “é um animal particularmente feroz, que devora e destrói todas as razões” 01. Mais do que do denominado pobre de direita é preciso falar do pobre de direitos, daquele (endinheirado ou não) cuja consciência é prisioneira das crenças. Quem só crê e de nada duvida tende a criminalizar a Filosofia. Segundo o filósofo Cassirer, o verdadeiro inimigo da fé é a superstição, não a dúvida. 02. As crenças, tão bem manipuladas pela extrema direita e disseminadas nos esgotos das redes ditas sociais, também funcionam como forma de prisão cognitiva. Nunca se deve menosprezar o poder da estupidez. As sombras da ignorância são mais velozes do que podem imaginar as luzes do iluminismo. Desistir de suas luzes? Jamais. 03. Estudante de Filosofia e Teologia, cedo compreendi a diferença entre o regime da crença (tendente a dispensar mediações) e o regime da Ciência (que implica o filtro filosófico da crítica). Para Anselmo de Aosta, mais teólogo que filósofo, e célebre pelo esforço de provar a existência de Deus pela razão, a teologia era uma forma de “inteligência da fé”. 04. Sob o regime da crença o sujeito torna-se possuído pelo objeto que domina sua cognição. É um ser possuído. Kant chamaria a isso de consciência heteronomizada. Uma consciência sem a posse de si, caracterizada por Adorno como um tipo de sujeito sujeitado, a dedicar-se “à conservação de si mesmo sem si mesmo”. 05. No evangelho mesmo há muitos casos de mentes possuídas que foram libertadas por Jesus de Nazaré, um filósofo sem cátedra (conforme Morin) e desvinculado da Atenas socrática. Na Ciência, dá-se o contrário da crença: é o sujeito que se apropria do objeto. É o que, na epistemologia, denominamos de (penoso) processo de objetivação da realidade. 06. A extrema direita é hábil em manipular o sentimento e as categorias do mundo religioso para fanatizar consciências incautas. Ainda por volta de 17 anos, numa carta dirigida a seu pai, o jovem Marx admitia ser impossível penetrar no mundo do conhecimento e da Ciência sem a contribuição da Filosofia, que é mais porto de saída do que de chegada. 07. O poder tirânico, ontem e hoje, odeia a crítica, afronta à cultura, destrói a memória, falsifica a história, despreza a arte e tende a se refugiar no patriotismo que, segundo Samuel Johnson “é o último refúgio do canalha”. No Brasil é o primeiro, completou Millôr Fernandes, um dos meus santos de profana devoção. Longa e fecunda vida à Filosofia!
MEIO AMBIENTE – Para uma ecoteologia da Mãe Terra. Artigo de Leonardo Boff
“Face à urgência ecológica, a alternativa que se impõe é esta: ou cuidamos de nossa Mãe-Terra ou não haverá uma arca de Noé que nos salve. Bem disse o Papa Francisco em 2025 na encíclica Fratelli tutti (Todos irmãos e irmãs): ‘estamos no mesmo barco, ou nos salvamos todos ou ninguém se salva’”, escreve Leonardo Boff, teólogo, filósofo e escritor. Eis o artigo. Não apenas os pobres gritam. Grita também a Terra, feita o Grande Pobre, espoliada em seus bens e serviços naturais limitados. O Papa Francisco falou há dias sobre o grito da Terra e dos pobres. A maior agressão que se lhe faz é não considerá-la como Grande Mãe, Casa Comum e Gaia, um superorganismo vivo que se autorregula e combina todos os elementos necessários para sempre se autorreproduzir e gerar vidas, especialmente, a vida humana, a maior floração do processo de evolução. Ela mal consegue dissolver os desequilíbrios e ainda manter a capacidade de nos alimentar e toda a comunidade de vida. Hoje, no entanto, ela está se mostrando debilitada. É a sobrecarga da Terra (Earth overshoot). Foi demasiadamente explorada devido à voracidade de alguns cujo projeto é acumular para si bens materiais de forma ilimitada sem sentido de justa partilha com o resto da humanidade. O pior está ocorrendo recentemente. Há um recuo na diminuição de emissão de gases de efeito estufa, o que agrava o aquecimento global com as consequências conhecidas. Não se reconhecem os direitos da natureza e da Terra, reduzida a um baú de recursos para embasar o projeto ilusório de um crescimento ilimitado, sabendo-se dos limites insuperáveis do planeta. Cresce a consciência, a partir do Overview Effect dos astronautas que viram a Terra de suas naves espaciais e testemunham que a Terra e a humanidade formam uma única e complexa entidade. Os humanos expressariam aquele ponto de complexidade em que a Terra começou a andar, a pensar, a cantar, a se comover e principalmente a amar. Face à urgência ecológica, a alternativa que se impõe é esta: ou cuidamos de nossa Mãe-Terra ou não haverá uma arca de Noé que nos salve. Bem disse o Papa Francisco em 2025 na encíclica Fratelli tutti (Todos irmãos e irmãs): “estamos no mesmo barco, ou nos salvamos todos ou ninguém se salva”. Por isso, na opção pelos pobres contra a pobreza, deve-se incluir a Terra, como o Grande pobre. É nossa missão baixá-la da cruz e ressuscitá-la para que mantenha sua vitalidade. Uma teologia da libertação integral deve ser uma ecoteologia de libertação como tenho defendido desde os anos 80 do século passado e finalmente oficializada pelo Papa Francisco em sua encíclica Laudato si’: sobre como cuidar da Casa Comum. A ética ecológica fundamental, suporte de qualquer outro imperativo, exige: que faço para salvaguardar a vida da Terra e na Terra e permitir que todos os seres possam continuar a existir e a viver? O segundo imperativo ético é este: que faço para conservar as condições do ser humano poder subsistir e continuar a evoluir como tem evoluído por milênios. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui