SOCIEDADE – Tu vens, tu vens: breve reflexão para cristãos ou não

Aos militantes da teimosa esperança adventícia, cabe mais acender velas que amaldiçoar a escuridão Chegamos ao primeiro domingo do Advento. Esse tempo é mais que “litúrgico”(para quem tem alguma religiosidade): é uma exortação ao renascimento, para todas as pessoas de boa vontade. O evangelho de Lucas (21, 25-28, 34-36) pede ânimo: “levantem-se e ergam a cabeça, porque a Libertação está próxima!” (v. 28). Não se trata de uma fé cega, ingênua, alheia às realidades do mundo. Tanto que o chamado à renovação pessoal e social está emoldurado pela crise, pelas “nações caindo em desespero” (v. 25) e “os homens desmaiando de medo e ansiedade” (v. 26). Foi naquele tempo; é hoje: bombardeios matando população civil (notadamente na terra de Jesus!), planeta doente, exaurido pela ganância, xenofobia expulsando emigrantes, deserdados, exploração do trabalho, racismo, misoginia, homofobia. Entre nós, também a trama golpista contra a frágil democracia, terrorismo do “sr. Mercado Faria Lima” especulando com o dólar, poderosos reagindo à taxação de super-ricos, chantageando para manter a injustiça tributária e aprofundar desigualdades. Enquanto o individualismo cresce no país das apostas, das bets, da “prosperidade” por golpe de sorte, a solidariedade, a luta por direitos, a batalha pelo bem comum parece derrotada. “Tomem cuidado para que os seus corações não fiquem insensíveis, por causa da gula, da embriaguez, das preocupações da vida” (v. 34). O “espírito de Natal”, que o comércio propaga, é, para muitos, o do “compro, logo existo”, do curtir o imediato e dane-se o resto… Mas não! Advento é aposta profética, é acreditar, mais uma vez, no Natal da Eterna Criança, no renascimento, na superação dos males, no sentido redentor do inevitável sofrimento. É desapegar-se de tudo que é efêmero e, atento e forte, elevar-se, em prece e atitude. Nascemos para renascer! “Quanto mais escura a noite, mais carrega em si a madrugada”, profetizou D. Helder Câmara (1909-1999). Aos militantes da teimosa esperança adventícia, cabe mais acender velas que amaldiçoar a escuridão. Para melhor enxergar as possibilidades da História e acreditar que o obscurantismo não prevalecerá! Fonte: Site ICL Notícias Matéria Completa: Acesse Aqui

MUNDO – Assim as universidades se entorpecem

Produtivismo neoliberal levou a Academia à miséria criativa – e burocratizou a produção de saberes. Sofrimento, que poderia ser estímulo à reinvenção da vida, é sufocado por gestão química. Poderíamos construir outra ética do cuidado? O conceito de “saúde mental” é usado de modo amplo e abrangente, relacionado a uma ambição  idealizada de vida equilibrada, significando em nossa sociedade hedonista, vida alegre e sem sofrimentos.  Daí emergirem outros conceitos que lhe dão suporte e vida prática, tais como: “bem-estar emocional”;  “autoconhecimento”; “autocuidado”; “autoestima”; “resiliência”; “relacionamentos saudáveis”; “produtividade e motivação no trabalho” e a busca por “prevenção” que aumente a capacidade de lidar com  situações de estresse, frustração e tristeza, além de estar sempre disposto a enfrentar desafios. Ou seja, o  conceito vai se mantendo em uso, a partir de mudanças em seus arrimos estruturais. Devemos sempre relacionar os modelos de vida humana (ou modos de viver) com a chamada “saúde mental”. Se a “mente” é um conceito herdado da Grécia Clássica (500 a.c. – 300 a.c.), “doença mental” emerge no século XVIII, dando condições para o nascimento da Psiquiatria (Foucault 1961/1978), e é um  termo que permanece sendo usado com muita frequência até hoje. Não é possível que, depois de 260 anos de  criado, esse conceito fique, parafraseando Caetano Veloso, “impávido que nem Muhammad Ali”. Deve ser  questionado, porque se fez insinuando que, nós, humanos, temos uma essência, a qual nos diferencia de todas  as outras espécies vivas, e essa tal essência é nominada como “alma”, “mente”, “subjetividade” ou “psiquê”. O incrível é ainda se sustentar que os nossos sofrimentos humanos são divididos em físicos e  metafísicos, estes se referindo a uma “sofrença mental”. Assim, tanto a mente quanto seu suposto  adoecimento, constituem-se como um “dado evidente”. Isso é espantoso em uma sociedade moderna  sustentada na linguagem dita objetiva e que supõe decodificar a natureza por meio de aparatos tecnológicos. A busca de certos campos do saber por biomarcadores (ou marcadores físicos), para o que se julga não físico, parece infinda. Na disputa por hegemonia biopolítica, as ciências exatas e biomédicas dedicaram-se a  colonizar o território das chamadas ciências humanas e sociais. O projeto de colonização se iniciou na Renascença e teve seu auge a partir do século XIX. Como afirma Foucault, ao se reportar a Psicologia, é preciso acordar desse sono dogmático (Foucault, 1965/2002), se realmente quisermos enfrentar nossas dores, sem nos esquivarmos de suas fontes, recorrendo a drogas, sejam quais elas forem. O psiquiatra e psicanalista húngaro Thomas Szasz, começou a criticar o uso do termo “doença  mental” como um conceito em um artigo datado de 1958. O autor argumenta que se trata de uma construção  teórica não uma verdade factual. Portanto, não é mais nem menos “factual” do que crenças em feitiçarias e   afirmar que alguém está possuído pelo demônio (Szasz, 1979a; 1979b). O autor já apontava que alterações no cérebro ou um “defeito neurológico”, não podem ser automaticamente relacionados com um conceito  efêmero como mente. Fonte: Site Outras Palavras Matéria Completa: Acesse Aqui

SOCIEDADE – “A alegada universalidade e neutralidade do canônico é um ponto de vista masculino”. Entrevista com Adriana Cavarero

A filósofa e feminista italiana Adriana Cavarero (Bra, 1947) comete um roubo de enredo: sequestra certas figuras femininas que aparecem nos textos de Platão (pelas quais o autor não sente uma simpatia especial), e as ressignifica, dando-lhes uma visão, um significado diferente, tornando-as soberanas de si mesmas, com profundidade (e altura) singulares. O resultado, A pesar de Platón (Galaxia Gutenberg). Eis o Artigo Quando é apropriado contrariar o mandamento divino e roubar, saquear, saquear, roubar, descontextualizar? É conveniente quando se deseja reinterpretar o texto filosófico a partir de uma perspectiva inesperada, como a do sujeito feminino que a tradição do texto patriarcal expulsou, confinando as mulheres à esfera doméstica e retirando-lhes a voz. Aristóteles diz, por exemplo, que as mulheres falam, mas as suas palavras não têm autoridade. Basicamente, elas conversam. Mais do que com Platão, não deveríamos confrontar todos aqueles que continuam a manter a desigualdade que encontramos desde o início na maioria dos textos filosóficos? Claro, Platão é apenas o pai da filosofia e todos os seus filhos, ao longo dos séculos, coletando seu legado, aderem à abordagem misógina de filosofar. Nos meus livros roubo todos os seus textos, é um prazer. O que acontece com todas aquelas mulheres que se identificam com Platão, na perspectiva que você combate, com Circe, com Penélope, vista do ponto de vista canônico? É natural que muitas mulheres eruditas continuem a seguir a tradição em que foram educadas. Nas últimas décadas, porém, os Estudos sobre a Mulher e os Estudos de Gênero desenvolveram-se numa grande parte do mundo acadêmico, o que torna mais fácil estar atento à alegada universalidade e neutralidade do ponto de vista canônico, que é na verdade um ponto de vista masculino. O lugar da mulher a que o homem relegou foi o oikos, a casa e os seus habitantes, o mundo da escuta, dos afetos. Será mais a impossibilidade de abandoná-la do que o próprio lugar atribuído que pesou na desigualdade? É difícil escapar a todos os papéis estereotipados que a tradição atribuiu às mulheres e que continuam a pesar na sua vida real. Porém, desde Mary Wollstonecraft e toda a história do feminismo até hoje, a crítica à desigualdade e a consciência da liberdade feminina deram passos gigantescos. Pelo menos no mundo ocidental, há uma grande diferença entre a prisão doméstica em que a minha avó viveu e o mundo das mulheres livres e emancipadas em que as mulheres vivem hoje. O feminismo em que me reconheço tem o objetivo preciso de ajudar as mulheres a pensarem-se fora dos papéis tradicionais, mesmo fora de um modelo de igualdade que corre o risco de assimilá-las aos homens e aos valores masculinos, em suma, ajudá-las a pensar livre na sua diferença. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui

ARTIGO – LUIZA ERUNDINA 90

1934 – 30 de novembro – 2024: a Deputada Federal Luíza Erundina (PSoL) completa hoje 90 anos. Nas veias e artérias do coração amoroso e  militante dessa mulher irredenta, nascida na pequena cidade de Uiraúna, na Paraíba, corre sangue vermelho em forma de utopia, corre luta, corre tenacidade, correm projetos de emancipação social e de  educação libertadora, construídos coletivamente com a parceria de mãos e mentes solidárias como as de Paulo Freire, o Patrono da Educação Brasileira, por ela convocado para assumir a Secretaria de Educação da cidade-estado de São Paulo durante o seu mandato de Prefeita no período de 1989-1993.   Nordestina como Paulo Freire (este de Pernambuco), Luíza Erundina, formada em Serviço Social, governou para todos a partir da periferia de São Paulo e nunca se dobrou ao preconceito (inclusive de setores da esquerda), à misoginia, ao machismo, ao racismo, à intolerância, à discriminação e à criminalização da política, sobretudo de parte da arrogância financeira da parte mais abjeta e majoritariamente branca da burguesia paulistana. Luíza Erundina, viva, plena de lucidez, generosa, sábia, é sobrevivente de um Brasil que em pleno século XXI continua atravessado e assolado pela mais degradada desigualdade social.   Luíza Erundina, aos 90 anos, mulher de mil lutas, é o que há de mais saudável e ético nesse Brasil em que o Estado (por meio das instâncias governantes) trama contra o Estado Democrático de Direito. Luíza Erundina não se dobra, é cipó de aroeira em meio a uma casa parlamentar ocupada pelo que existe de mais reacionário e regressivo na política brasileira. Luíza Erundina merece lugar de honra no Panteão das Mulheres Irredentas, ao lado de tantas outras, indígenas, pretas, brancas, de todas as cores, mulheres da estatura de Elizabeth Teixeira (viva e a caminho de completar 100 anos em 13 de fevereiro de 2025) e Carolina Maria de Jesus, para aqui me ater a uma Trindade Paradigmática.   LUÍZA ERUNDINA, guerreira do povo brasileiro!