RELIGIÃO – As mulheres livres são um perigo. No Irã e não só. Artigo de Shady M. Alizadeh
O silêncio que acompanha a resistência de mulheres e homens no Irã tornou-se insuportável e encontra eco no resto do mundo. É nossa tarefa fazer ecoar o canto de liberdade e democracia no Irã. O artigo é de Shady M. Alizadeh, advogada e ativista Mulher, Vida, Liberdade, publicada por Domani, 25-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini. Em realidades como a da República Islâmica, mas também em muitas outras partes do mundo, as mulheres livres são consideradas um perigo. É por isso que somos chamadas de “loucas”. As mulheres iranianas, na realidade, são heroínas para todas nós, porque conseguem erguer a cabeça contra um regime belicista. Mulher, Vida, Liberdade não é apenas um lema, mas representa uma visão clara da sociedade e do mundo que assusta porque redesenha os limites do poder e dos poderosos e se contrapõe ao poder patriarcal e violento que só quer abusar e possuir nós, mulheres. Nós, mulheres, relegadas às margens, encarnamos a hipótese obstinada e não mais clandestina de que uma sociedade alternativa sem violências, ódio, abusos e guerras é possível. O que o movimento representa uma clara convicção de que um mundo diferente é possível, um mundo que não nos odeie, e que acabe com essa guerra secular contra nós. Há 45 anos, o povo iraniano está empenhado em uma resistência, também feminista, para a obtenção da liberdade, por um Estado iraniano democrático contra um regime que odeia suas próprias cidadãs e seus próprios cidadãos. Dois anos após o assassinato de Mahsa Jina Amini, testemunhamos violências contínuas, detenções, estupros, torturas, assassinatos e prisões contra aqueles que se manifestam em solidariedade às mulheres. No mês de julho, o regime islâmico condenou à morte Sharifeh Mohammadi, sindicalista, e Pakhshan Azizi, ativista curda iraniana. A culpa deles é a de violar a segurança do Estado. Desde 30 de julho, e todas as terças-feiras da semana, as mulheres no Irã fazem greve de fome promovida por Narghes Mohammadi, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz de 2023, e outras ativistas presas na prisão de Evin para exigir o fim das execuções. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui
MUNDO – Uma COP que caiu no poço (por José Sarney)
Os países ricos pensam que irão salvar-se, com esses 300 bilhões de dólares Uma longa e prolongada salva de palmas explodiu quando o Presidente da COP29 anunciou que tinham chegado a um acordo: 300 bilhões de dólares dos países ricos para financiar medidas destinadas a combater e limitar o aumento do clima no mundo. Mas logo em seguida levantou-se um dos delegados — eram três horas da manhã — e disse: “Estes aplausos não são para este vergonhoso acordo, mas sim porque o Sr. Presidente anunciou que está encerrada esta fracassada Conferência.” Nesse momento repetiram-se os aplausos. Os delegados, exaustos, dormiam por todos os lados, uns em sofás amassados, outros no chão em grossos tapetes. Uma coisa muito difícil é o êxito dessas conferências. Esta, a COP29, dias antes do fracasso, transferiu a solução dos financiamentos dos países em desenvolvimento para a próxima Conferência, já convocada para Belém, que tem a sedução chamativa de ser localizada na cidade que fica na foz do Rio Amazonas, com toda a sua grandeza, suas lendas e seus mistérios. A primeira reunião promovida pelas Nações Unidas em busca de um pacto global para enfrentar o problema do Meio Ambiente e o despertar do mundo para a destruição da natureza e a liberação de gases tóxicos ocorreu em Estocolmo, em 1972, quando pela primeira vez se discutiu um novo modelo de desenvolvimento. Eu era Senador nesse tempo e fiz o primeiro discurso no Congresso Nacional sobre Meio Ambiente, analisando o que fora discutido em Estocolmo. Já em 1989 eu era Presidente do Brasil e apresentamos o Brasil para sediar a Segunda Conferência do Meio Ambiente, fizemos um acordo para que se realizasse no Rio de Janeiro, o que foi aprovado: em 1992, quando eu já tinha deixado o Governo, ocorreu a Rio-92, também conhecida como Eco-92. A Conferência foi um sucesso, com grande repercussão social, e despertou o mundo. Mas o problema do clima ainda não era a bola da vez. Assim, estamos agora, com evidência científica, sabendo que, se não enfrentarmos seriamente o aquecimento global até o fim do século, os oceanos crescerão, as cidades das orlas estão ameaçadas de inundação, as chuvas aumentarão, assim como o número de tsunami, de secas e desastres climáticos, e assim começará a destruição da Terra. Fonte: Site Metrópoles Matéria Completa: Acesse Aqui
POLÍTICA – Apontamentos sobre a “crise” na caserna. Artigo de Manuel Domingos Neto
O indiciamento de militares golpistas suscita muitas reflexões. Pode haver reações violentas dos comandantes? O STF se intimidará? Como afastar as corporações da política? Debate deve ser sóbrio e passar por uma nova concepção de Defesa Nacional. O artigo é de Manuel Domingos Neto, historiador, professor, pesquisador, escritor e político brasileiro que foi deputado federal pelo Piauí, publicado por Outras Palavras, 25-11-2024. Eis o artigo. Estivemos à beira de mais uma ditadura? Estaremos sempre, enquanto persistir a síndrome pós-Guerra do Paraguai. Homens armados se veem superiores aos desarmados. Se bem treinados, maior a sensação de superioridade. Se enfileirados, uniformizados e afastados da convivência social, imaginam-se capazes de tudo. Pretendem-se dignos de glória e subjugam os que lhes sustentam. Para o poder político, comandá-los é tarefa obrigatória. Não há meios termos: ou comanda ou é submetido. Os ânimos nos quais quartéis estão acirrados? O clima é de apreensão sobre os desdobramentos das investigações. Há profundo mal-estar com a saraivada de denúncias e críticas desabonadoras. Corporações têm instinto de defesa: percebendo-se atacadas, tendem a se unir, não a se fragmentar. Ocorrerão tentativas de intimidar a Justiça e o Comandante Supremo das Forças Armadas. É preciso enquadrar os oficiais da ativa e da reserva que extrapolem. Caso os comandantes das corporações não enquadrem os ativistas explícitos, estarão prevaricando. Pode haver reações violentas dos comandantes? Não creio. Sabem que perderão. Os militares aprenderam a planejar, a agir por “aproximações sucessivas”. Certamente, há pressões internas, mas nada que arranhe a cadeia de comando. As corporações respeitarão a Justiça? Vejamos como será o processo judicial. A Justiça vai contemporizar? Essa é a tendência. O “diálogo” desmoraliza a Justiça, assim como o poder político. Militar é preparado para obedecer, não para dialogar. Se o militar não sentir firmeza na autoridade, buscará submetê-la. O inquérito da PF atinge de fato todos os responsáveis? De forma alguma. Até agora, atingiu criminosos notórios, o que representa um grande feito. Mas, Villas Bôas, incentivador de baderneiros, ficou fora da lista. Todos os comandantes de unidades que agasalharam golpistas em suas calçadas têm contas a prestar. Os que discursaram nos quartéis, nem se fale. Aguardemos o andamento do processo. O STF não pode se intimidar. Se mostrar medo, a porta do inferno continuará aberta. O prosseguimento das investigações mostrará os comandantes de unidades militares que prevaricaram ao permitir acampamentos de baderneiros. Esses ajuntamentos sediciosos foram financiados por políticos e empresários, que também devem contas à Justiça. Não estou propondo o aprisionamento de milhares de oficiais. Mas a análise das responsabilidades corporativas é imprescindível. Essa não é apenas tarefa da Justiça, mas do Parlamento e do Executivo, que só agirão pressionados pelo movimento democrático. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui
MUNDO – “Absolutamente insano”: funcionários do Pentágono sobre o plano de Trump de usar militares na deportação de imigrantes
O artigo é de Silvio Falcón, cientista político, publicado por La Marea e reproduzido por Outra Palavras, 25-11-2024. A tradução é de Rôney Rodrigues. “Donald Trump fez campanha com a promessa de fazer deportações em massa e, na segunda-feira (18 de nov), disse que a sua administração usaria os militares dos EUA para realizar esta expulsão de milhões de pessoas, muitas das quais vivem nos Estados Unidos há anos ou mesmo décadas”. A reflexão é de Nick Turse, em artigo publicado orginalmente no The Intercept, e reproduzido por Voces del Mundo, 22-11-2024. A tradução é do Cepat. Nick Turse é editor-chefe do TomDispatch e membro do Type Media Center. Seu livro mais recente é Next Time They’ll Come to Count the Dead: War and Survival in South Sudan e é autor do best-seller Kill Anything That Moves. Donald Trump fez campanha com a promessa de fazer deportações em massa e, na segunda-feira (18 de nov.), disse que a sua administração usaria os militares dos EUA para realizar esta expulsão de milhões de pessoas, muitas das quais vivem nos Estados Unidos há anos ou mesmo décadas. Historicamente, os militares dos EUA não desempenham funções de controle da imigração e normalmente não desempenham funções policiais. Mas quando Tom Fitton, presidente do grupo conservador Judicial Watch, publicou nas redes sociais que a próxima administração “usará recursos militares para reverter a invasão de Biden através de um programa de deportação em massa”, Trump respondeu: “Verdade!!!”. O governador do Texas, Greg Abbott, já seguiu a estratégia legal de declarar que o fluxo de imigrantes é uma “invasão”, argumentando que o governo federal descumpriu seu dever constitucional de proteger os Estados de potências estrangeiras e que o Texas deveria ter o direito de usar a sua Guarda Nacional como força de deportação. Os deputados republicanos do Arizona fizeram a mesma afirmação. Trump também sugeriu anteriormente que recorreria a poderes de guerra para colocar o seu plano em prática. O Pentágono rejeitou publicamente a promessa de Trump de usar os militares para fazer deportações em massa. “O Departamento não comenta hipóteses nem especula sobre o que pode ocorrer”, disse um porta-voz do Departamento de Defesa ao The Intercept. Nos bastidores, os funcionários estavam exasperados. “É absolutamente insano”, disse um funcionário do Pentágono que pediu para não ser identificado porque não estava autorizado a falar com a imprensa sobre o assunto. “Nunca pensei que veria o dia em que esta seria uma política ‘séria’ – coloque entre aspas”. Ele disse que os obstáculos legais e logísticos seriam imensos e que a proposta era “pouco realista e pouco séria”. Outro funcionário do Departamento de Defesa de um escritório diferente, que também não estava autorizado a falar com a imprensa, teve quase exatamente a mesma reação. “É uma loucura”, disse sobre o anúncio de Trump. “No primeiro dia do meu mandato, lançarei o maior programa de deportação da história americana para expulsar os criminosos”, disse Trump durante um comício no Madison Square Garden, em Nova York, nos últimos dias da campanha presidencial. “Resgatarei cada uma das cidades que foram invadidas e conquistadas, e colocaremos esses criminosos cruéis e sedentos de sangue na prisão, e então os expulsaremos do nosso país o mais rápido possível”. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui
Uruguai: a esquerda volta de cara nova. Artigo de Silvio Falcón
Quem é o novo presidente, discípulo de Mujica. Como a renovação de quadros e o convite ao diálogo nacional foram chaves. O grande desafio do novo governo: aumento da violência, num dos “países mais seguros da América do Sul”. O artigo é de Silvio Falcón, cientista político, publicado por La Marea e reproduzido por Outra Palavras, 25-11-2024. A tradução é de Rôney Rodrigues. Eis o artigo A Frente Ampla é, há vinte anos, a principal força política no Uruguai. Ao contrário do que se poderia entender numa perspectiva europeia, este é um fenômeno sem precedentes na política latino-americana, em tempos de polarização e num contexto de ascensão de populismos. O sistema partidário deste pequeno país só mudou para garantir um lugar privilegiado a esta coligação de partidos de esquerda, que consolidou a sua presença institucional através das duas presidências de Tabaré Vázquez e do mandato de Jose Mujica. Os adversários da Frente Ampla têm sido os blancos e colorados: o Partido Nacional e o Partido Colorado, que durante o último mandato liderou a chamada coligação multicolor que levou Lacalle Pou à presidência. Em 2019, o candidato da Frente Ampla, Daniel Martínez, venceu no primeiro turno (40,49% dos votos), mas foi derrotado pelo atual presidente por uma margem muito estreita (50,79% contra 49,21%). Essa experiência serviu à Frente Ampla para renovar a sua cara e aproveitar a força do seu poder territorial para construir a candidatura presidencial deste ano. Nas eleições internas da Frente Ampla, uma espécie de primárias abertas a todos os cidadãos, os dois pré-candidatos que aspiravam a liderar a candidatura de esquerda vieram de cargos relevantes na estrutura departamental do país: a prefeita de Montevidéu, Carolina Cosse, e o prefeito de Canelones, Yamandú Orsi. Este último contou com o apoio do Movimento de Participação Popular (MPP), força política dos antigos guerrilheiros tupamaros liderada pelo casal Mujica-Topolanski. A clara vitória de Orsi (59,1%) contra Cosse (37,6%) permitiu-lhe afirmar-se como candidato da Frente e, ao mesmo tempo, como sucessor de Mujica. A candidatura resultante aproveitou todo o capital político de formação, já que Orsi incorporou Cosse como candidato à vice-presidência, formando um poderoso contingente eleitoral com várias matizes. Desde o retorno da democracia em 1985, a política uruguaia tem sido marcada por homens de uma geração similar – nascidos entre as décadas de 1930 e 1940 – como os ex-presidentes Sanguinetti, Batlle, Luis Alberto Lacalle ou os próprios Tabaré e Mujica. Nas fileiras da Frente Ampla, uma terceira figura completa este mapa geracional: o ex-ministro da Economia e ex-vice-presidente Danilo Astori. Estes antigos líderes morreram ou retiraram-se da linha de frente política devido à idades avançadas. O último a fazê-lo foi o incombustível ex-tupamaro Mujica, com um discurso contundente sobre as mudanças na política: “Os melhores líderes são aqueles que saem de um grupo que os supera com vantagem”. O legado de Mujica hoje leva o nome do novo presidente do Uruguai, Yamandú Orsi. A direita uruguaia, porém, soube interpretar esta mudança geracional antes da esquerda, lançando Luis Lacalle Pou em 2019, e usando uma campanha presidencial que usou o poder da comunicação política. Qualquer uruguaio que votou em 2019 se lembra do jingle eleitoral dos blancos, que promovia mudanças positivas; uma modernização que contrastava com as antigas lideranças. “É agora”, dizia a comunicação da campanha. E então ele se fez presidente. A impossibilidade de reeleição imediata no sistema presidencial uruguaio obrigou o partido de centro-direita que estava no poder a mudar de candidato. Álvaro Delgado, ex-secretário da Presidência do governo Lacalle Pou, foi o escolhido pelos blancos. No primeiro turno, Delgado (26,82%) ficou longe dos resultados obtidos por Orsi (43,92%), mas chegou ao segundo turno com a possibilidade de reeditar uma coligação de direita com o Partido Colorado (16,07%), os ultradireitistas de Cabildo Abierto (2,48%) e do Partido Independente (1,70%). A única saída para a direita se manter no poder exigia reavivar a coligação multicolor, mas nesta disputa eleitoral surgiu uma nova força populista (Identidade Soberana, 2,8% dos votos) que solicitou o voto nulo no segundo turno. Uma decisão que, face aos resultados, foi decisiva na eleição de Orsi. Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos Matéria Completa: Acesse Aqui