RELIGIÃO – Francisco contra a idolatria do capital. Artigo de Michael Löwy

O artigo é de Michael Löwy, diretor de pesquisa em sociologia no Centre nationale de la recherche scientifique (CNRS), publicado por A Terra é Redonda, 23-04-2025.

Bergoglio não foi, é claro, um papa marxista. Mas a encíclica Laudato si’ é uma contribuição preciosa e inestimável diante da catástrofe socioambiental. Papa foi lúcido, ao questionar elites e a “ecologia de mercado”. Cabe à esquerda completar seus diagnósticos com propostas radicais.

Eis o artigo.

A morte de Jorge Bergoglio, o Papa Francisco, marca o fim de uma figura pouco comum, que se destacou, numa Itália governada por neofascistas e numa Europa cada vez mais reacionária, por um engajamento ético, social e ecológico surpreendente.

Depois que Pio XII excomungou os comunistas, a esquerda só podia esperar anátemas do Vaticano. João Paulo II e Joseph Ratzinger não perseguiram os teólogos da libertação por utilizarem conceitos marxistas? Não tentaram impor um “silêncio obsequioso” a Leonardo Boff? É claro que, desde o século XIX, sempre existiram correntes de esquerda no catolicismo, mas elas encontraram somente hostilidade por parte das autoridades romanas.

Por outro lado, as correntes clericais críticas do capitalismo eram geralmente bastante reacionárias. Criticando o socialismo feudal ou clerical no Manifesto Comunista, Marx e Engels notaram “sua absoluta incapacidade de compreender o curso da história”; mas reconheceram nesta mistura “de ecos do passado e ameaças ao futuro” uma “crítica mordaz e espirituosa” que podia por vezes “atingir a burguesia bem no coração”.

Max Weber propôs uma análise mais geral da relação entre a Igreja e o capital: em sua obra sobre a sociologia das religiões, ele constata a “profunda aversão” (tiefe Abneigung) da ética católica ao espírito do capitalismo, apesar das adaptações e compromissos. Esta é uma hipótese que deve ser levada em consideração se quisermos compreender o que aconteceu em Roma com a eleição do papa argentino.

Jorge Bergoglio, o Papa Francisco

O que poderíamos esperar do cardeal Jorge Bergoglio, eleito Pontifex Maximum em março de 2013? Claro, ele era latino-americano, o que não deixava de ser um sinal de mudança. Mas ele tinha sido eleito pelo mesmo conclave que tinha entronizado o conservador Joseph Ratzinger, e vinha da Argentina, um país onde a Igreja não é conhecida por seu progressismo, com vários de seus dignitários tendo colaborado ativamente com a sangrenta ditadura militar.

Não foi esse o caso de Jorge Bergoglio: segundo alguns relatos, chegou até mesmo a ajudar pessoas perseguidas pela junta a esconderem-se ou a abandonarem o país. Mas também não se opôs ao regime: um “pecado de omissão”, poderíamos dizer. Enquanto alguns cristãos de esquerda, como Adolfo Pérez Esquivel (Prêmio Nobel da Paz), sempre o apoiaram, outros viam-no como um opositor de direita ao governo dos “peronistas de esquerda” Néstor e Cristina Kirchner.

Seja como for, uma vez eleito, Francisco – nome que escolheu em referência a São Francisco, o amigo dos pobres e dos pássaros – distinguiu-se imediatamente por sua atitude corajosa e engajada. De certa forma, ele lembra o Papa Roncalli, João XXIII: eleito “papa de transição” para garantir a continuidade e a tradição, iniciou a mais profunda mudança na Igreja depois de séculos: o Concílio Vaticano II (1962-65). Bergoglio tinha inicialmente pensado em adotar o nome de “João XXIV” para homenagear seu antecessor da década de 1960.

Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos
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