Um olhar sobre o oligopólio das revistas científicas. Como desviam recursos da pesquisa, cobrando (até R$ 73 mil!) para que cientistas publiquem artigos ou para que o público os leia. A alternativa da Ciência Aberta e o esforço para sabotá-la
O ano de 2025 pode trazer mudanças na ciência internacional. Novas iniciativas prometem dar um basta na exploração comercial de conhecimentos científicos que é exercida por um oligopólio internacional de editoras científicas. Tais empresas controlam o acesso a este conhecimento cobrando taxas crescentes para leitura de artigos científicos que elas publicam; cobram também para disponibilizar esses artigos de forma aberta em suas plataformas digitais. Isso tem drenado recursos públicos que financiam a maior parte dos estudos científicos internacionalmente. Ao invés de atender a interesses privados, tais valores poderiam ser empregados para fazer novas pesquisas, em especial em países que investem pouco em ciência e tecnologia, como o Brasil. Com o intuito de alterar este cenário, a partir do ano que entra, o governo do Japão e uma das maiores filantropias para a ciência, a Fundação Bill e Melinda Gates, dos Estados Unidos, exigirão que os resultados de todas as pesquisas que financiam tenham acesso gratuito e não pagarão mais taxas a editoras comerciais para que isso aconteça.
Se essa moda pegar, isso trará avanços para a disseminação mais igualitária de conhecimentos. Mas é improvável que apenas isso altere o status quo da ciência. Umas das razões é que tais políticas não levam em conta que o poder desse oligopólio não resulta apenas do controle que ele tem sobre os artigos que publica. Algoritmos presentes em suas plataformas digitais definem também o que os cientistas leem e citam. Ademais, esses algoritmos fornecem indicadores de produção científica que são usados, ironicamente, pela própria comunidade científica para determinar quais pesquisadores receberão verbas para desenvolver novos projetos. Está nas mãos desta comunidade alterar esta situação mudando a forma de avaliar o mérito de pesquisadores.
Quanto custa ler um artigo
Artigos (ou papers) são produtos resultantes de pesquisas científicas escritos em linguagem técnica e que têm o objetivo de disseminar conhecimentos entre especialistas. Há centenas de milhões de artigos publicados desde 1900 disponíveis online. Para ler boa parte deles é necessário pagar às editoras comerciais que os publicam em revistas científicas (também chamadas de periódicos).
Por exemplo, é necessário desembolsar cerca de R$ 240 para baixar um artigo que trata do impacto da emergência climática na floresta amazônica, liderado pela cientista Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) (US$39,95, com dólar a R$6,00 câmbio que será usado nesta reportagem). Este artigo foi publicado na revista Nature em 2023 – a revista científica considerada a número 1 do mundo. O artigo não custa caro só porque foi destaque de capa de uma revista prestigiosa, pois o valor se aproxima da média praticada pelas revistas científicas em geral.
Tal custo existe a despeito de empresas como a Nature não financiarem pesquisas que dão origem aos artigos e jamais terem remunerado autores por suas publicações. Além disso, o controle de qualidade dos artigos não é realizado pelas revistas e sim por outros pesquisadores. A maioria deles revisa gratuitamente o mérito dos artigos (revisão por pares, ou peer review). Os demais agem como editores, que decidem se um trabalho contribui para a literatura e merece ser publicado, só alguns dos quais são contratados pelas revistas científicas. Todo este processo reflete a forma tradicional de publicação de artigos que existe há séculos e será tratada aqui.
Até os anos 1940, pagava-se menos para ler artigos porque as revistas pertenciam a sociedades científicas sem fins lucrativos e que tinham custos baixos: editoração, impressão e distribuição pelo correio. Isso mudou no pós Segunda Guerra Mundial, como detalhado em uma reportagem informativa de 2017 do jornal britânico The Guardian, escrita por um de seus editores de opinião, Stephen Buranyi. Os governos da época, ao identificarem a importância de promover ciência para o desenvolvimento, começaram a financiar a maior parte das pesquisas e pesquisadores, como fazem até hoje. Só que tais recursos públicos não se estenderam às associações científicas que publicavam artigos. Isso fez com que elas não conseguissem disseminar artigos de forma considerada eficiente por estes Estados. A consequência disso foi a criação de espaço para a entrada de empreendimentos comerciais neste setor, com aporte financeiro privado que assegurou publicações mais rápidas.
Fonte: Site OUTRAS PALAVRAS
Matéria Completa: Acesse Aqui