ARTIGO – CAPITAL POLÍTICO, POLÍTICA DO CAPITAL E POBRE DE DIREITA

Quanto aos pobres – a permanecer o reino do capital (acréscimo nosso),
vós sempre os tereis convosco (Jesus de Nazaré, Jo 12,8).

01. Consciência de classe, consciência política, consciência crítica ou capacidade de discernir por meio daquele estágio de autonomia cognitiva designado por Immanuel Kant como esclarecimento, jamais podem resultar de geração natural, menos ainda de miséria social. Se miséria social gerasse consciência de classe os por volta de 800 milhões de pessoas no mundo que vivem abaixo do que se define como Limiar Internacional da Pobreza já estariam em estado de insurreição social.

02. Quando reina a política do capital o capital político do pobre é expropriado pela burguesia e por não se reconhecer como classe explorada, o pobre (submetido à consciência de rebanho) passa a integrar o crescente exército social do (aparentemente) contraditório pobre de direita. Aparentemente contraditório para quem nunca leu uma linha do velho Marx: numa sociedade de classes a ideologia dominante é necessária e inevitavelmente a ideologia da classe dominante. Nem mais, nem menos.

03. O grande pensador da hermenêutica no século XX, Gadamer, ao refletir sobre o caráter oculto da saúde (título de um livro homônimo), assegura que o verdadeiro objetivante é a doença e não a saúde. Tivesse Gadamer por Marx o mesmo interesse que devotou a Heidegger, veria que a doença por si mesma não tem poder de gerar no doente nenhuma consciência ou objetivação sobre o mal que lhe compromete a saúde. Sem consciência de classe a natureza social da doença que acomete o doente tende a se naturalizar.

04. A miséria da doença termina por conferir normatividade social à patologia que subtrai vida ao doente. Somente em Marx é possível discernir o que diferencia a busca heideggeriana pelo ser do ente da objetivação social (marxiana) do ser doente numa sociedade apartada em classes. Não é possível superar a abstração metafísica heideggeriana do esquecimento do ser sem que o ser seja pensado, como o faz o materialismo histórico e dialético, a partir de suas determinações concretamente históricas e sociais.

05. A sociedade de classes gera a apartação social da miséria e da doença. A política do capital determina a consciência do pobre e do doente e sabe como produzir e manter tanto o pobre quanto o doente de direita. O doente não se revolta porque é doente e é doente porque não se revolta. O pobre (de consciência) não se revolta porque é pobre e é pobre de consciência porque não se revolta. Existirá sistema (?) de saúde mais doentio, perverso e excludente do que o mantido pela maior potência capitalista do mundo?

06. Essa aporia patológica (ou beco sem saída doentio) já havia, noutros termos, sido formulada por George Orwell ao afirmar que os pobres não têm consciência porque não se rebelam e não se rebelam porque não têm consciência. Adicionando Marx a Orwell, podemos dizer: consciência e rebeldia passam pelo método da luta de classes, sem o que não é possível nem organização nem consciência de classe. Vem da pátria do capital (idolatrada pela extrema direita) a lição de que o capital empobrece e adoece.

07. Nada mais doentio e distópico do que ver nos dias que correm, num mundo em decomposição, a bandeira da rebeldia nas mãos (sujas e cheias de sangue) da extrema direita. Em lugar de liberdade, vamos construir saídas. O que só é possível pela esquerda, classista, e que não teme chamar-se pelo nome de consciência de classe. Apostar no protagonismo e na luta da classe trabalhadora rumo ao desafio da construção de uma sociedade sem classes, verdadeiramente livre e radicalmente humana.

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